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Precisamos falar sobre a morte

“Para morrer, basta estar vivo”. Se tem uma coisa que é certa nesta vida é que vamos morrer um dia. É a única certeza absoluta da nossa existência. Eu vou morrer, você vai morrer, seu vizinho vai morrer, seus colegas, seus familiares. Não sobra ninguém. Nós  não sabemos quando, não sabemos como, não sabemos o porquê. Porém, no fundo,  sabemos que esse dia vai chegar. Mais cedo ou mais tarde. Dizem que uns partem cedo demais, que outros partiram de forma injusta. A verdade é que qualquer que seja a causa ou a circunstância, a morte dói. A perda é irreparável, você fica dilacerado: não há nada, absolutamente nada, que nos prepare para isso.   

E apesar de todos nós sabermos disso, ninguém fala a respeito.   Não conversamos, não discutimos. Simplesmente vivemos como se fôssemos imortais e como se todas as pessoas especiais fossem imortais. E até nos esquecemos de como a dor é profunda, porque parece que quando a morte não envolve alguém conhecido – seja de perto ou de longe, famoso ou não – uma morte se torna mais um número. Morrer é tão normal como viver. “Para morrer, basta estar vivo”. Deveríamos falar mais sobre isso. Mas parece que é um assunto proibido. Ou, então, parece que somos super confiantes – ou especiais o bastante para pensar que isso não vai acontecer tão cedo.

Eu me peguei pensando – e muito – sobre esse assunto há alguns dias. E isso aconteceu por dois motivos. O primeiro foi uma história que me comoveu bastante, da professora Ana Beatriz Cerisara, que se descobriu em um estágio terminal de triplo câncer no intestino. Resolveu não se submeter a nenhuma cirurgia e deixar a vida seguir seu curso natural. No vídeo, publicado pela revista Veja, Ana abre o coração, expõe suas razões e como se prepara para a chegada da morte. Ela fala tudo com muita naturalidade e serenidade – e até humor, quando lamenta que vai morrer sem saber o final de Game of Thrones, sua série favorita. Aquilo me tocou de um jeito a ponto de me deixar pensativa por alguns dias. Muita gente acha corajoso enfrentar uma doença como essa e se submeter a tratamentos invasivos – porém, não dá para dizer que a escolha da professora é tão corajosa quanto. Ir contra o “senso comum” e optar por alguns meses de vida com qualidade, ao lado da família não deve ser uma decisão fácil. Não deve ser fácil saber que você não vai estar aqui no próximo Natal, nem vai ver sua neta crescer – e não vai poder saber o final de Game of Thrones.

Alguns dias depois, tive a notícia de que minha mãe teve uma suspeita de câncer no útero – suspeita que a levou a fazer uma biópsia e tudo mais. A suspeita se revelou falsa – o que fez eu me sentir aliviada, mas é óbvio que a possibilidade disso tudo me deixou incrédula. Primeiro, porque o nome da doença em si já assusta. Por alguns momentos, imaginei a minha vida sem ela, e meu coração disparou. Fui invadida por uma onda de tristeza que marejou meus olhos. Foi um soco no estômago. Algo que me trouxe para terra firme e me lembrou que ninguém é imortal. De que não é só com os outros que essas coisas acontecem. Afinal, quem sou eu no meio de bilhões de pessoas no mundo para ser privilegiada com uma vida sem perdas e sem problemas? E lembrei das minhas escolhas, dos ônus e dos bônus de estar morando fora do país. Lembrei  todas as vezes que vi alguém no Facebook pedindo ajuda para comprar uma passagem com urgência, pois alguém querido no Brasil havia partido. Lembrei  todas as noites que eu acordei, do nada, pensando em minha família que está longe e que eu não posso fazer nada para protegê-los de todos os males do mundo; todas as vezes que vi conhecidos anunciando a morte de alguém; todas as mortes mais “esperadas” – se é que podemos usar esse adjetivo – às mortes que te chocam, tamanha a fragilidade da vida.

Precisamos, sim, falar mais sobre isso. Mas talvez nenhuma palavra no mundo seja capaz de confortar o suficiente.


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